Como é do conhecimento geral, decorre no Catar o Campeonato do Mundo de Futebol, organizado pela FIFA (Federation Internationale de Football Association). Trata-se de um dos maiores eventos desportivos, que reúne 32 seleções dos cinco continentes, trazendo, ao país organizador, apoiantes de todas as partes do globo. Para um país em desenvolvimento como o Catar, isto deveria ser encarado como uma oportunidade de mostrar o que há de melhor no seu país e as suas potencialidades...aparentemente foi o que fizeram...na sua visão, claramente closed-minded.
Para clarificar esta questão, decidi realizar um levantamento de algumas das principais ameaças/implicações associadas com a realização do mundial no Catar. Começando pelas mortes de milhares de trabalhadores migrantes na última década, a maioria dos quais ligados ao Campeonato do Mundo, que permanecem inexplicáveis e sem investigação. Segundo a Amnistia Internacional, pelo menos centenas dessas mortes deveram-se a trabalhar em calor extremo, o trabalho forçado, a falta de folgas, salários reduzidos e passaportes confiscados. O diretor da Amnistia Internacional para a justiça económica e social, Steve Cockburn, afirmou que “Apesar dos repetidos avisos dos próprios trabalhadores e de grupos da sociedade civil, a FIFA falhou em impor condições fortes para proteger os trabalhadores e se tornou um facilitador complacente para os abusos generalizados sofridos”.
A negação dos direitos das mulheres é outras das questões relevantes, cuja qual não podia deixar de ser mencionada. A Human Rights Watch (HRW)realizou um estudo em 2021, onde foi verificado que as leis, regulamentos e práticas do Catar impõem regras discriminatórias de tutela masculina, que negam às mulheres o direito de tomar decisões importantes sobre as suas vidas. As mulheres têm de ter permissão dos seus tutores masculinos (membros da família do sexo masculino) para casar, estudar fora do país, trabalhar em empregos públicos, viajar e receber cuidados de saúde reprodutiva, entre outras questões.
Isto para não falar da grande resistência que o Catar mostra contra o movimento LGBTQ+ (Lesbian, Gay, Bissexual, Transgender, Queer, etc.). O código penal do Catar pune relações sexuais consensuais entre homens a partir dos 16 anos de idade com até sete anos de prisão; e penas de um a três anos para quem “instigue” ou “induza” outro homem a “cometer um ato de sodomia ou imoralidade”. Uma pena que pode alcançar os dez anos é imposta a quem se envolver em relações sexuais consensuais fora do casamento, o que se aplica tanto a relações homossexuais como heterossexuais. Em outubro, a HRW denunciou que o Ministério do Interior mandou prender arbitrariamente pessoas LGBT, e submeteu-as a maus-tratos, incluindo espancamentos graves e assédio sexual. Estes, por entre outros assuntos fazem do Catar um país demasiado conservador, parado no tempo e que tenta abolir tudo aquilo que é diferente. Como é que um país deste tipo pode abraçar um evento com a dimensão do Campeonato do Mundo? A pergunta de mil milhões de dólares.
Alguns líderes da Europa subestimam esta situação, começando pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo da Sousa: “O Catar não respeita os direitos humanos... Mas, enfim, esqueçamos isso”. A França decidiu seguir o exemplo de Portugal, através de Emmanuel Macron: “Não devemos politizar o desporto”. No entanto, nem todos os líderes europeus pensam assim, graças à Deus, principalmente os que estão no topo da Comissão da UE, sendo Ursula von der Leyen, a presidente da Comissão da UE a figura dominante, tendo sido a única a adotar uma posição de boicote. Para além das figuras políticas, outras de cariz público, nomeadamente artistas, mostraram a sua indignação e desprezo em se deslocar ao Mundial do Catar: nomes como Dua Lipa (“Visitarei o Catar quando o país cumprir todas as promessas em matéria de direitos humanos que fez”); Rod Stewart (“Os adeptos têm de ter cuidado”) e ainda Shakira.
Posto isto, pode-se concluir que ainda que exista uma tentativa da FIFA em incluir todos os países na organização deste tipo de vendas, a fim de aludir à inclusão, diversidade e igualdade; países de mentalidade retrógrada, como é o caso do Catar, que negligenciam os direitos humanos e a sua população, deveriam ser automaticamente excluídos. Querem igualdade, não querem ser vítimas de discriminação? Comecem-se a comportar como verdadeiros seres humanos, e não como monstros, sedentos de poder, estatuto e reconhecimento.