O dia a seguir a umas eleições é, na minha opinião, o verdadeiro dia de reflexão. Do que se passou nas urnas e da leitura que esses resultados podem trazer, ainda para mais quando as sondagens se mostraram tão discrepantes.
Faço, primeiro, uma declaração de interesses: sou militante do PSD e, inclusivamente, exerço funções no poder local como Presidente da Mesa da Assembleia da União de Freguesias de Santa Maria da Feira, Travanca, Sanfins e Espargo.
O PSD e o CDS — que pode até estar no caminho da extinção — são dois dos grandes derrotados destas eleições e ambos têm um duro caminho pela frente se quiserem reabilitar-se e aproximar-se do seu eleitorado de base. E aqui quem ensina esta direita mais histórica é precisamente António Costa, que sabe unir o seu partido (note-se que Pedro Nuno Santos é um dos seus principais opositores ideológicos e, ainda assim, o seu lugar é inquestionável). O resultado do PS é realmente esmagador, mas não significa a derrota da direita, que aliás, se reforçou. E sim, esse reforço significa um aumento substancial dos deputados do CHEGA, mas, ainda assim, é um reforço da direita.
Será pertinente questionar como (ou onde) o CHEGA e a IL se reforçaram tanto e a resposta é, no mínimo esclarecedora. Expectavelmente, a IL reforçou-se nos meios mais urbanos, onde a população é, teoricamente, mais letrada. Aqui, no círculo eleitoral de Aveiro, a IL ficou a 2000 votos de eleger um deputado. Acredito que consiga encurtar essa distância daqui a 4 anos e fico feliz. Porque acredito numa democracia plural, onde todos podem ser ouvidos. Precisamente por isso, não me choca a eleição de Rui Tavares (ainda que pessoalmente não me reveja no LIVRE), que acho trará perspetivas e questões ao Parlamento que Joacine Katar Moreira não foi capaz.
Já o CHEGA cresceu substancialmente em territórios que, tipicamente, eram fiéis à CDU e isto parece-me ter tanto de inusitado, como de elucidativo. Se por um lado, nunca imaginei o Alentejo virar ao que chamam fascismo encapotado, também me parece claro que esta subida do CHEGA tem muito de descrédito dos partidos instalados - todos eles, sem exceção - mas com destaque para a CDU, naquele que é um dos seus bastiões.
Então e a esquerda? Bom, a esquerda perde. Ou pelo menos, a esquerda não socialista. O que aconteceu domingo passado mostra como o PS, que é obviamente o grande vencedor destas legislativas, é capaz de, praticamente sozinho, galvanizar a esquerda. O tal "voto útil". E isso preocupa-me. Porque preferia que todos pudessem votar em consciência ideológica e não com medo do partido que é agora a terceira força política nacional. Acredito, inclusive, que muito do eleitorado chamado flutuante, fugiu da direita precisamente por receio de uma eventual coligação com o CHEGA.
O PAN, cuja mensagem ambientalista faz falta ao Parlamento, não foi capaz de apelar ao seu eleitorado, podendo questionar-se se alguma vez o teve assim tão firme. Já Catarina Martins e Jerónimo de Sousa têm aquilo que semearam com a sua política de apoio desresponsabilizado, em que criticam nuns dias para viabilizar nos outros e que provocou esta crise política, por muito que eles o neguem. E se choca e entristece o crescimento do CHEGA, custa-me perceber porque a esquerda radical não é também vista como um perigo e sim como um aliado à governação. Ouvi na noite eleitoral, e não pela primeira vez, Marisa Matias dizer que ainda assim atingiram o objetivo principal que era impedir a maioria de direita. Fiquei estupefacta. Não só porque jamais me ocorreria que se possa interpretar os resultados de domingo passado como uma vitória para o BE, seja qual for a perspetiva, como porque se me afigura algo profundamente antidemocrático que um partido prefira derrotar a vencer. O tal parlamento plural, em que todos os portugueses encontrem ecos para a sua voz, num país onde haja mais literacia política e onde o voto possa ser verdadeiramente livre (e não apenas útil) é, para mim, o caminho que todos os partidos têm de percorrer para verdadeiramente vencer um ato eleitoral.