No mês de novembro assistimos à criação de uma ‘task-force’ para ajudar as escolas a procurar professores para suprimir horários que ainda não tem ocupação. Até 2030 estima-se que seja necessário contratar 34,5 mil novos professores para dar continuidade ao Ensino da forma como o conhecemos.
A grande questão é mesmo esta, vamos continuar com este sistema de ensino obsoleto, baseado na normalização, na exposição desmedida de conteúdos e totalmente focado na meta dos senhores doutores e engenheiros? Um sistema de ensino do passado, com docentes do presente e alunos do futuro?
Num Ensino totalmente assombrado pela violência, pelo bullying, pela falta de interesse dos alunos e dos professores, pela inflação dos resultados escolares para poderem subir nos rankings, pelo mascarar de problemas porque prejudicam a imagem da escola, pelo empurrar com a barriga as culpas do mau funcionamento das instituições e por tantos outros tabus do Ensino.
Hoje as questões como a disciplina, as regras, o saber estar, as normas de conduta e a própria educação são, por vezes, encaradas como restrições à liberdade da criança. Tal como a polícia está quase impedida de usar as suas armas também os professores estão de ‘mãos atadas’ com os ‘limites limitados’ e, caso sofram algum ato de violência, são aconselhados a permanecer em silêncio e alegar que foi um acidente de trabalho.
A profissão de valorização, respeito e dignidade, do verdadeiro “Senhor Professor” dissipou-se no tempo e é hoje considerada uma profissão de ‘segunda’. O que está a acontecer no nosso Ensino é o puro reflexo da nossa sociedade. Um País que exige os seus direitos, mas que, demasiadas vezes, se esquece dos seus deveres.
O Estado exige do Ministério da Educação que por sua vez exige das instituições educativas, que por sua vez exigem das direções, que por sua vez exigem e culpabilizam os docentes pela falta de resultados. Os pais, pressionados pelos quadros de honra e pela corrida às universidades, exigem dos professores. Os alunos que, tal como quem devora conteúdos atrás de conteúdos em direção aos testes, culpabilizam os professores por não terem um Ensino direcionado a si, aos seus gostos e interesses, ao seu ritmo de aprendizagem e exigem formas de ensino mais acessíveis e abrangentes.
Esta exigência sobre os professores a nível de flexibilização, de conteúdos, de programas, cidadania, valores, educação e burocracia está completamente desajustada dos salários auferidos. Em início de carreira os docentes ganham mal e o caminho para a estabilidade parece uma longa e penosa maratona com paragens em lugares longínquos a vários quilómetros de distância da sua família. Os professores sentem-se constantemente pressionados para conseguirem produzir resultados perfeitos com alunos imperfeitos.
Exige-se que a educação e os valores venham de casa, mas, para tal benesse, é necessário tempo e disponibilidade. Os pais trabalham cada vez mais horas e, quando chegam a casa, estafados de mais um dia de trabalho, sobra apenas tempo para cozinhar, arrumar, dar banho e colocar os filhos na cama. Quando não podemos dar-lhes tempo entretemo-los com televisão e telemóveis na ínfima esperança de que estes os eduquem e os preparem para a ferocidade da vida presente e futura.
Os professores também têm o direito e o dever de educar. Através do exemplo de ser, estar e agir serão merecedores do respeito e da admiração porque, no fundo, são eles que passam grande parte do dia com as crianças e podem ser a diferença positiva na vida destes.
Os docentes, com falta de recursos físicos e humanos, começam a abandonar a sua vida profissional e a desenvolver outras áreas de interesse e sustento. As escolas queixam-se de falta de auxiliares de ação educativa que mantinham a ordem e o cuidado pela comunidade educativa e pelos espaços físicos da escola.
Este é um assunto muito complexo e carece de uma verdadeira ‘task-force’ que pense o Ensino e que o reestruture, que o direcione para a criança como ser individual, com interesses e ritmos de aprendizagem individuais, que o muna de novas ferramentas de ensino nunca dando primazia ao ensino expositivo e com maior flexibilização nos conteúdos programáticos. Este ensino não está adaptado às necessidades do mercado de trabalho e do trabalhador. Foi criado para suprir as necessidades de ontem, adaptado ao dia de hoje, mas completamente desatualizado do dia de amanhã.
A criança necessita de treinar e desenvolver a sua criatividade e a resolução de problemas. Estas raramente são trabalhadas e serão das maiores valências do sucesso individual do futuro adulto, as tão badaladas soft skils. Quando o desenvolvimento natural da criança necessita de explorar, de conhecer, de descobrir e interagir com o mundo, a Escola obriga-a a estar sentada um dia inteiro numa cadeira a ouvir a autoridade do professor. "Eu digo e tu memorizas!" E passarão a vida toda a obedecer sem questionar, sem pensar e sem espírito crítico.
O professor também deverá mudar completamente o seu mindset, a sua forma de ensinar e pensar a criança. Estas estão em constante mudança e evolução. As crianças de hoje não são iguais às da geração anterior e os professores e o Ensino têm de se adaptar constantemente a elas e às suas necessidades.
As Escolas precisam de maior autonomia para poderem acompanhar esta evolução. Não basta reagir sobre os problemas expostos. Temos bons exemplos no Ensino Público e no Ensino Privado. Temos já vários exemplos de novas metodologias usadas noutros países e com resultados extraordinários. Temos também outras vertentes como o Ensino profissional que é ainda demasiado desvalorizado, mas vital para colmatar as necessidades recorrentes do mercado de trabalho.
Esta é uma responsabilidade de todos e a mudança terá de partir do coletivo. As crianças de hoje serão os adultos de amanhã. A aposta tem de ser para eles porque eles serão o nosso futuro.
Não vamos virar a cara ao problema porque, mais dia menos dia, ele vai-nos explodir nas mãos!