Nos últimos anos, genericamente um pouco por todo o país, assistiu-se a uma evolução das condições ambientais, económicas e sociais às quais não é alheia uma profunda alteração do novo enquadramento legal relativo ao regime de solos e à actividade de planeamento (Lei de Bases da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo (LBSOTU), a Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, publicado pelo Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, e demais legislação complementar, que estabelece os critérios para a classificação e reclassificação do solo bem como critérios de qualificação e das categorias do solo rústico e do solo urbano.
De facto, a lei de bases procedeu a uma reforma estruturante, quer no sentido de definir um conjunto de normas relativas à disciplina do uso do solo, quer no sentido ou objectivo de traduzir uma visão conjunta do sistema de planeamento e dos instrumentos de política de solos, entendidos como plataformas de excelência da execução dos planos territoriais.
Com o novo “impulso” legislativo, ficou implícita a eliminação da denominada categoria operativa de “solo urbanizável” enquanto espaço territorial expectante e sem programação assinalável a curto, médio e longo prazo.
Nesse âmbito, o solo urbano, corresponde ao que se encontra total ou parcialmente urbanizado ou edificado e, como tal, afecto em plano territorial (PDM) à urbanização ou edificação. Por outro lado, o solo rústico, corresponde àquele que, pela sua reconhecida aptidão, se destina, nomeadamente, ao aproveitamento agrícola, pecuário, florestal, à conservação e valorização de recursos naturais, à exploração de recursos geológicos ou de recursos energéticos, assim como o que se destina a espaços naturais, culturais, de turismo e recreio, e aquele que não seja classificado como urbano.
Em suma, numa linguagem popular, os critérios para que um prédio ou espaço territorial, se possa doravante considerar apto para fins construtivos, traduzir-se-ão na existência de edificações e sua consistência territorial ou de frente urbana e, ainda, pela consolidação do funcionamento das várias infraestruturas, nomeadamente via pavimentada, rede eléctrica, rede de abastecimento de água e saneamento.
Feito o enquadramento, e no caso de Santa Maria da Feira, decorridos poucos anos sobre a publicação da primeira revisão do PDM, surge então a necessidade de adequar o plano director municipal aos novos conceitos de classificação e uso do solo, iniciando-se assim um novo ciclo que culminará, certamente, com a consolidação de um renovado instrumento de gestão territorial: o denominado PDM de 3.ª geração.
Tendo sido deliberado o início do procedimento em 2019 e com prazo de elaboração e publicação até ao último trimestre de 2021, “quis” a pandemia COVID19 originar a necessidade da prorrogação desse mesmo prazo até final de 2022. Tal prazo, devidamente consagrado pelo Decreto-Lei N.º 25/2021, de 29 de março (alteração ao Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio), vem por isso, CONVOCAR-NOS A TODOS, PARA UMA REFLEXÃO CONJUNTA SOBRE O QUE QUEREMOS PARA A NOSSA TERRA.
Esta será, porventura, a derradeira oportunidade para reforçarmos e afirmarmos o nosso território, a sua resiliência e a promoção de uma maior qualidade de vida para os feirenses.
O desafio é, pois, dar resposta aos temas emergentes da sustentabilidade e da solidariedade intra e intergeracional: seja na prioridade à reabilitação e regeneração urbana, na colmatação, diversificação funcional e flexibilização regulamentar do uso do solo… seja na valorização ambiental, paisagística e de biodiversidade ou de utilização do solo de acordo com a sua natureza e aptidão. Seja na promoção de uma mobilidade sustentável, na eficiência energética e adaptação às alterações climáticas… seja na coesão, solidariedade e participação cívica dos cidadãos nas dinâmicas territoriais.
Além disso, no caso da classificação e uso de solo, nada garante que um determinado prédio, actualmente inserido em “zona de construção”, possa manter esse mesmo estatuto. Existem inúmeras variáveis que o podem condicionar ou até alterar. E o cidadão comum têm direito de o saber: todos os dias existem opções, acordos familiares, transacções ou negócios jurídicos que importam acautelar. Mesmo do ponto de vista de enquadramento fiscal, IMI, IMT, está tudo em jogo…
Esta revisão do PDM é muito mais do que uma simples adequação gráfica ou escrita.
Por isso, TODOS contam. O que está em causa é demasiado importante para não ser um processo participado. Impõe-se, por isso, convocar toda a população para o debate.
Nunca como agora as noções de escala, respeito pelo sítio, dimensão estratégica, a percepção/antecipção dos custos de infraestruturação e sua respectiva manutenção se assumiram como critérios tão relevantes a ponderar. Assim, parece resultar claro que a classificação e reclassificação do solo (como e para) urbano estará limitada ao indispensável, pelo que se afigura aconselhável e mesmo necessária a sua efectiva programação.
E por fim, a questão da nossa dimensão estratégica.
O município tem, objectivamente, de “dizer ao que anda”. O que queremos para as nossas cidades, vilas ou aldeias. Como queremos programar as nossas infraestruturas, qual o seu impacto, o seu verdadeiro custo. Quem, quando e como se pagam?
Não mais será possível condicionar o território com espaços ou vias estruturantes que, ao fim de 30 anos não foram programados nem executados… Não mais será possível fazer crescer um território sem a prévia estruturação e programação das suas infraestruturas e equipamentos de apoio. Não mais será possível delimitar grandes áreas vazias e expectantes à mercê de quaisquer lógicas de especulação imobiliária.
Espero que, em breve, toda a população seja convocada para o debate e para a decisão. Trata-se de um imperativo legal e de consciência. Temos três meses…
Será, pois, com base nessa lógica, que contribuiremos e traduziremos parte do nosso compromisso face às gerações vindouras…
O autor escreve de acordo com a anterior ortografia