Tenho 19 anos, sou filho de uma ferrageira e de um responsável de armazém. Sou neto materno de uma viúva, a quem ficou a responsabilidade de dez filhos, pequenos, e paterno de um ex-empresário e agente associativo. Sou filho único, o que me confere algum privilégio, desde logo. Para além do mais, felizmente, nunca tive os meus pais desempregados. Poderia elencar outros privilégios, nomeadamente, no que se refere a uma infância pautada de paz. Olho à minha volta e não vejo um cenário cor-de-rosa, o que me deixa a pensar:
O que devemos fazer com o privilégio? Guardá-lo, rodearmo-nos de privilegiados ou perceber como ajudar aqueles que, outrora, sujaram as mãos de óleo, e encravaram as unhas, para fazê-lo alcançar? Eu escolho a segunda. Não posso conceber existirem poucos a lucrar com a impotência de muitos. Não defendo um Estado dono de tudo, mas um Estado libertador, ao garantir a educação, a saúde, a justiça, o essencial à condição humana. O Estado que eu defendo dá enfoque àquilo que é imaterial, que é muito mais do que aquilo que é material, sendo que, este último tem enchido páginas de boas práticas político-partidárias. Afinal ele deve ser a instituição prestigiante, representativa do povo, com base na rotatividade assídua e na transparência. O Estado nunca será perfeito porque ele é o espelho do Homem, que por sua vez é perverso. Quem nunca o foi na vida? Bem, sejamos francos. Agora a verdade é que muito mais é o que nos une do que aquilo que nos separa e, assim, aproveitemos as partes para somar um Estado que sublime o indivíduo. Não à custa de feitos sebastianistas, mas razão da consciência e afinco de todos.
Se há luxo em que eu acredito é na educação. Por muito que se queiram definir metas de prosperidade, estas não podem safar a preponderância da educação como princípio da esperança de um povo. A educação quebra os medos e atesta um modo de ser e estar que honra a civilização e cumpre a meritocracia.
Como calculam decidi sair do PSD, não por mediocridade, mas por uma questão de integridade. A vida tem destes momentos, em que arejamos quem somos. A direita portuguesa tem-se tornado num albergue de uma linguagem histérica e melancólica e com um forte complexo social. Chegará o tempo em que a sociedade de tanto ruído quererá o silêncio imposto, e não poderei contribuir para isso. Daí que o Estado providência foi, é e será a âncora da democracia.
Com a dignidade com que fui educado assumo as minhas posições. Tratei de comunicar a quem devia esta decisão e espero que esta seja entendida com o respeito com que sempre me relacionei com os outros. No que se refere à realidade do meu concelho aplica-se o mesmo sentimento socialista. Não podemos continuar a alimentar uma democracia sem pousio. Descubro, depois de ter iniciado o meu envolvimento associativo aos 15 anos, que a esquerda é afinal um farol de oportunidade, de tolerância e novidade e que a direita se tornou num condomínio de elites. A diferença está entre a ética e a estética. É momento de querer o coletivo.