– Ó bezinha, cagoniada eu fiquei ontem à noite, bezinha. Taba eu na cama cu meu home cando bi calquer cousa a rabiar antre nós os dois, bezinha. Ó mulher, fiquei assim a modus tão cheia e prenha de medo quinté me insaltei toda. Ó xico, berrei pra ele, mas o murcão do meu home, que já tinha bubido seis srebeijas antes de se deitar, continuaba ferrado no sono e num daba por nada. Aí, peguei e cuas duas mãos procurei achar a coisa. Bai daí..
– Agarrou–a, foi?
– Cais agarrei, caquilho era uma santopeia, uma nojenta santopeia, grande comó caraças, mais maor, munto maor queu sei lá o quê. Num olhei pra mai nada; pulei da cama e berrei: Xico, ó Xico, num te meixas canda aqui um bicho piçonhento. Aí, peguei na bassoira pá matar, mas falhou-ma mão e arriei uma balente cornada cua bassoira na michela do meu home quele acurdou logo e inté aguinchou que nem um porco. Mas à sigunda, à sigunda acertei na istapurada da santopeia, caquilho era cá uma bicha do caraicho, quinté tinha mais patas do que pêlos o meu Xico tem na michela.
– Michela? Ó mulher, você sabe o que é uma michela?
–Atão num hei–de eu saber outra cousa, que michela é a tola, a cabeça, a carola do meu home, porra queu já le disse isso.
– Não, não é nada dísso, minha santa. Michela quer dizer meretriz, prostituta.
–Deixe masé bocê de se armar em sabichona fina queu falo assim qué falar munto bein e todo mundo intende, oubeu?
– A minha amiga é que sabe. Quanto a mim calo–me, que o calado é o melhor e o mais sensato.
–Lá bem bocê a crer tirar palabras do rabo cum garfo, ca tola do meu home num é ninhuma dessas cousas que bocê disse, nem é ninhuma pu pu pu, prantos, num digo que num é bunito de dezer. E mai le digo ca tola do meu Xico é bein bunita e bein rija. Pegue lá, qué pra bocê num se armar em shesperta. E não comece tipo a gozar, quisto, beija bein a cena, queu tamém sei falar tipo cumu se fala agora. Bocê está a tupar a cena, mana queu cuaquela coisa da cena tipo santopeia inté fiquei cus cabelos tipo coisa a tremer, mana. Istá a tupar a cena, mana queu bein ledisse que tamém sei deste tipo de cenas modernas, mana.
Deu para entender? É coloquialmente fluente e aceitável?
Se sim, vejo–me na obrigação de me desculpar e tirar o chapéu ao meu amigo insigne cultor da novel nomenclatura linguística ‘malacacasteleirense’ por o ter contrariado quando, como palestrante, ele afirmava "que o que importa não é o registo, mas a capacidade de o ler, de o interpretar, de o descodificar".
Reitero que não me revejo nesta ‘modernaça’ anarquia linguística, porém, vejo–me compelido a conviver (não a usar) com os novos ventos comunicacionais, que em muito irão afectar negativamente as futuras gerações, a menos que as castas que indevidamente dela (língua) se apoderaram, da mesma se vejam desafectadas.
Finalmente, ciente de que ao poder é dado o poder de inventar e reescrever a história, vejo–me obrigado à coabitação, não à obediência cega, nem à sujeição aduladora às altas sapiências e às supinas sabedorias.