"Uma paixão sem limites, só ela explica esta devoção, esta entrega de tudo o que era seu.
Um desprendimento total pelo dinheiro..."
História de uma Família (1880-1997), 1º Volume, Carlos Oliveira Santos, Mozelos: Grupo Amorim, 1997
O Colégio de Lamas celebrou 52 anos desde a sua fundação na passada quarta-feira, dia 5 de maio, assinalando a data com a plantação de uma oliveira como símbolo de resiliência. A data permitiu, também, comemorar o 93º aniversário do seu "fundador", título atribuído pela família que "controla" a instituição. Desculpem! Queria eu dizer pela actual Direcção da Instituição de Ensino.
Os Lamacenses, sobretudo os de idade mais avançada, recordam com nostalgia o processo acelerado de desenvolvimento que a sua querida Terra - "Rainha das Aldeias de Portugal" - presenciou na última metade do século XX. Esta bela localidade teve a sorte de contar com personalidades ímpares no contexto nacional, Homens que amavam as suas origens e muito faziam por elas, sem esperar nada em troca para si ou para os seus, como a história, à posterior, acabou por confirmar!
De entre essas personalidades constavam Henrique Alves Amorim, Veiga Macedo e José Ferreira (Padre Zé). Por vezes, a presença inolvidável de determinados indivíduos ofusca a grandeza de outros tantos, tal é o brilho do seu legado. Talvez por isso, o Dr. Veiga Macedo esteja mais dignamente representado na sede do Município, na subida para o Castelo de Santa Maria da Feira, do que na Terra que tanto amava.
Deparámo-nos então com uma efeméride. Não é que os donos disto tudo, consumidos por uma eventual amnésia selectiva, passam a celebrar a data do Colégio a 5 de maio, quando na verdade a data comemorativa é a de 25 de maio, data esta em que nasceu Henrique Alves Amorim. Como é possível, passados tão poucos anos, que se continue a tentar reescrever a história?! Há coisas que nunca mudam...
Os avanços económicos, sociais, infraestruturais, desportivos, educacionais e culturais alcançados por Santa Maria de Lamas devem, na sua génese, tudo a este Homem. Totalmente documentadas estão despesas pagas directamente do seu bolso, na módica quantia de 32 mil contos; isto seria o mesmo que dizer, aos nossos dias, mais de 13 milhões de euros!
Diga-se de passagem, há quem terra enriquecido Santa Maria de Lamas e há quem se tenha enriquecido com Santa Maria de Lamas. Confundir isto, é como mesclar a obra-prima do mestre com a prima do mestre de obra, o que, como bem sabemos, são coisas completamente distintas. Se dúvidas restassem ou, pelo caminho, alguém nos fizesse o favor de esclarecer a este respeito, certamente nos apresentariam a relação de remunerações anuais de todos aqueles que beneficiaram do legado de Henrique Alves Amorim e, agora, despudoradamente o menosprezam.
As táticas convencionais de storytelling (‘contadores de histórias’) permitem-nos compreender o que aqui se passa. Conta-se uma lengalenga anos a fio, comemoram-se os dias de aniversário do regime instalado, erradica-se o contraditório e, preferencialmente, submete-se as impressionáveis camadas mais jovens a esta narrativa até à exaustão e quando se dá por ela é já um dogma inquestionável.
Eu e tantos outros como eu crescemos nesse paradigma, absolutamente convencidos de que devíamos prestar vassalagem a sua excelência senhor doutor meritíssimo inquestionável Vieira (e depois disso, à respectiva linhagem), ao ponto de na data da comemoração do regime presentearmos o "deus" com uma pequena e singela lembrança.
Quem não se recorda daquelas datas em que os subordinados recordavam a necessidade dos impressionáveis jovens contribuírem com a sua parcela para agraciar o "deus"?! Quem não se recorda do quão incómodo e constrangedor era, não contribuir?! José Hermano Saraiva, certo dia, dentro do Museu de Santa Maria de Lamas reflectia sobre o seguinte: "Há pessoas tão grandes e que se julgam tão pequenas e pessoas tão pequeninas que se julgam tão grandes. Vá-se lá saber qual é o tamanho natural de cada um…"
O meu Amigo, Daniel Gomes, permitir-me-á invocá-lo num extraordinário artigo de opinião intitulado "O Segredo da Feira", onde explicava porque Portugal nascia em Santa Maria da Feira e não em Guimarães, recordando-nos com isso que antes da batalha, alguém a tinha preparado e planeado. Do mesmo modo, pergunto-me e pergunto ao Leitor: seria possível termos o Colégio de Lamas, sem que primeiro tivesse existido o Colégio Cristo-Rei? Vou um pouco mais longe, seria possível termos o Colégio de Lamas, sem Henrique Amorim? Pois então, quem é o fundador do Colégio?! É com enorme tristeza que assisto aos sucessivos atropelos do regime, àquilo que é dos Lamacenses.
O Colégio de Cristo-Rei foi construído com a indesmentível ajuda do nosso Comendador e noutros tempos era, precisamente, a 25 de maio que se comemorava o aniversário da Instituição... mas o regime mudou e quando o regime muda...Creio que os Lamacenses não se deixarão enganar, no entanto nunca será demais reforçar e registar para a história esta tremenda falta de consideração.
Aos Lamacenses o que é dos Lamacenses!
PS: recomenda-se para tratamento da amnésia selectiva a leitura atenta de "História de uma Família" (1880-1997), 1.º Volume, Carlos Oliveira Santos, Mozelos: Grupo Amorim, 1997.