Bernardo Gomes
Médico de Saúde Pública
ACES Entre Douro e Vouga I – Feira-Arouca
Estamos a fechar um ano ímpar no séc. XX. As pandemias acompanham-nos ao longo do tempo, exacerbadas pela nossa maior conectividade que tinha, no início do ano, o seu ponto mais alto da história. Estamos à beira de ultrapassar esta crise em tempo recorde, com o desenvolvimento de vacinas que nos irão permitir retomar a normalidade progressivamente. Aproveito para relembrar que a vacinação irá ser um processo moroso e que medidas estratificadas de controlo, com a colaboração de todos os parceiros na sociedade, terão de continuar pelo menos durante o primeiro semestre de 2021, com tendência progressiva de aligeiramento.
Dado o panorama global, olhemos para Arouca e Santa Maria da Feira, os concelhos que estão afiliados ao Agrupamento de Centros de Saúde Entre Douro e Vouga I. No dia 2 de março foi registado o primeiro caso de Covid-19 em Portugal. Pouco tempo depois começava a primeira onda, em que Santa Maria da Feira se viu rapidamente envolvida entre a intersecção da Área Metropolitana do Porto e Ovar, foco inicial conhecido. A situação abrandaria em meados de abril, sendo seguida de pequenas ondas secundárias no tecido industrial da Feira e, mais tarde, em Arouca. Na sequência deste último evento, englobados na temida “segunda onda” nacional, registámos um recorde de casos no mês de novembro.
Isto é certamente tudo amplamente conhecido.
O motivo pelo qual escrevo hoje é distinto. Antes de mais, sou um dos médicos de saúde pública deste agrupamento, com o pormenor de estar a tempo parcial e com outras atribuições para além do nível local, sobretudo durante a primeira onda. Isto também me deu alguma perspectiva adicional e de comparação com outros Agrupamentos, outros concelhos. Dá-me também margem adicional para elogiar o trabalho feito pela Unidade de Saúde Pública e de todos os seus profissionais. Mais margem ainda para elogiar o apoio que recebemos de todas as Unidades do Agrupamento de Centros de Saúde e dos esforços contínuos da Direcção Executiva e do Concelho Clínico em providenciar os meios necessários à resposta. Passámos um tempo especialmente complicado em novembro, mas garanto-vos que todos se bateram como leões e já com oito meses de trabalho quase ininterrupto nas costas. Estamos agora a recuperar do que foram mais de 4000 casos num mês, com alguns atrasos que não tinham sido sentidos até então.
Tenho ainda mais margem para elogiar todos os nossos parceiros na comunidade, com destaque merecido para o CHEDV, para ambas as Câmaras Municipais, para a Protecção Civil, para as Escolas, para todos que não nos deixaram desamparados e qua foram construindo connosco processos cada vez mais céleres e refinados para respondermos ao necessário. Amiúde tenho elogiado o pulmão associativo destes concelhos. O espírito de entreajuda, iniciativa e organização que se faz notar. Permitam-me dizer: obrigado. Facilitaram-nos a vida, estiveram connosco na esmagadora maioria das circunstâncias.
Permitam-me também pedir-vos dois últimos esforços. O primeiro é tomar todas as cautelas no sentido de um festejo contido, com o mínimo de pessoas, da época natalícia, com uma “dieta” social prévia ao dia e também depois, abstendo-se de se juntarem a outros agregados familiares de todo na passagem de ano. Também pedir ainda neste capítulo que não se juntem a ninguém se tiverem sintomas e, claro, se forem contactos de risco.
O segundo esforço é a visualização de uma estrada que se prolonga até ao final do primeiro semestre de 2021 que, ainda que seja cada vez mais fácil, irá pedir a continuidade de cuidados da nossa parte. Janeiro é o primeiro obstáculo em que podemos enfrentar uma terceira onda. Continuamos a precisar do espírito associativo e combativo que mencionei.
Ao escrever estas palavras, passam-me múltiplos rostos, entre várias unidades e instituições, que fizeram a diferença, que foram além do seu dever no esforço de proteger e cuidar das populações. Celebro-os de forma discreta e anónima neste texto, com a esperança de que todos percebam o quão tantos se esmeraram nesta grande luta da pandemia Sars-CoV-2.
Permitam-me evocar a memória colectiva, agora e para o futuro, para vos agradecer novamente e pedir estes últimos esforços.