Esta semana, Portugal assistiu a uma das maiores tragédias nacionais, no campo da gestão governamental. O desfecho da TAP é uma tragédia sem fim à vista.
As negociações, por parte do governo com os privados, foi uma encenação na qual o único prejudicado foi o Estado Português. Então porquê? Questionam muitos portugueses, sem ainda nada perceberem deste negócio falido, que vai trazer muita dor, dor nos bolsos dos cidadãos, dor de quem vai ficar sem emprego, quer diretos quer indiretos, dor de quem nem um ai vai conseguir encontrar nas medidas da nova gestão da TAP. Um quero, posso e mando, sem restrições, com acordos e favoritismos a um dos privados do Grupo Barraqueiro, quiçá num dos financiamentos de campanhas partidárias.
Soluções existiriam se desde o início o ministro das Infraestruturas colocasse uma ‘Open Gate’, porta aberta a negociações com novos consórcios, onde sem dúvida alguma, encontrariam uma melhor solução de salvamento da companhia aérea TAP, assim como de todos os postos de trabalho, sem que o Estado tivesse de ter esta ‘dor de cabeça’. Mas tal não aconteceu, devido a insistência duvidosa dos membros do governo.
A empresa, que nada valia há poucos anos, esteve para ser comprada, em março, por 800 milhões e acaba intervencionada em julho para evitar a insolvência. Já vamos às razões, comecemos pelas contas. Para que saibamos mesmo o prejuízo que comprámos. E porque é possível fazê-las. São três, quatro a cinco mil milhões de euros. Se tudo não correr pior que este mal, herdado sem fim.
Uma empresa abre falência quando deixa de ter dinheiro para pagar contas. Mas está ‘tecnicamente falida’ quando tem capitais próprios negativos, ou seja, quando os prejuízos acumulados já são superiores ao capital social, os empréstimos de sócios e as reservas constituídas. É o que a TAP tem às centenas de milhões desde 2008. Há 12 anos. 580 milhões em 2019.
A fragilidade do balanço da TAP não é nova. A empresa esteve sem receber injeções do Estado desde 1997, por impedimento das regras europeias. Foi acumulando dívidas, fez péssimos negócios (como o da criminosa compra da manutenção no Brasil, a VEM-Varig Engenharia e Manutenção) e chegou à privatização em aflição. A venda permitiu a entrada de fundos, mas com mais empréstimos do que capital. Não é preciso saber de contabilidade para percebê-lo: contra um passivo total de cinco mil milhões (dos quais três mil milhões de dívidas a bancos e empresas de leasing) existe um capital social de 15 ‘milhõezitos’ (acrescidos de 225 milhões de prestações suplementares de acionistas). Este é o balanço de uma empresazita falida, que insistimos em investir o dinheiro dos portugueses.
É difícil prever o futuro da aviação comercial e da própria TAP depois da reestruturação, mas os dados do balanço permitem fazer contas sobre cenários mínimos. Podemos estimar prejuízos neste ano de pandemia entre mil e 1,8 milhões de euros, o que significa que os capitais próprios chegarão ao final do ano com o valor negativo a rondar os 2,1 milhões de euros. Some-lhe o empréstimo de 1,2 mil milhões do Estado já anunciado. E adicione prejuízos futuros nos próximos (dois? três?) anos. Custo total: três, quatro a cinco mil milhões de euros. É uma intervenção ao nível das dos bancos. Estes por sua vez, recorrerão ao Estado para se auto financiarem e injetarem créditos na TAP, criando assim a bola de fogo que queima nas mãos dos portugueses vezes sem conta.
As perdas não serão todas para o Estado. A reestruturação há de significar renegociação com credores, sindicatos, de forma que esta reestruturação não fica isenta de despedimentos. Pelo que repreenderemos o significado de ‘haircut’, perdão de dívida. De quanto? 30% 40%? Veremos. Mas quer os bancos, quer as empresas de leasing, quer os obrigacionistas, quer sindicatos, entrarão numa mesa de distribuição de perdas. Nestes credores estão seis mil famílias portuguesas que compraram obrigações da TAP e um elevado número de trabalhadores que virão a ‘Gate’ do desemprego. Vai o Estado protegê-las? Poderá sequer fazê-lo? De que forma? Com que dinheiro?
Estamos numa ‘Gate’ porta de embarque para a austeridade...