“Empresários unem-se por um só objectivo: Fomentar o centro histórico”
Foi título no Correio da Feira e noticiava o aparecimento de uma nova associação de hotelaria, restauração e similares do centro histórico de Santa Maria da Feira. Digo nova porque, salvo erro, já existiu uma outra, com certeza com outra denominação, mas com o mesmo carácter associativista, reunindo um número de empresários, ligados aos nossos espaços de diversão nocturna no centro histórico.
Antes de dar continuidade a este meu texto de opinião convém relembrar que sou morador do centro histórico, por isso interessado directamente em tudo o que venha a introduzir mudanças, nas já muito sensíveis e difíceis condições de vida, vivenciadas pelos residentes deste centro histórico. Evidentemente, muito à conta de uma atitude irresponsável, parcial, injusta, imoral (como em muitos outros exemplos no nosso Concelho), sem nenhuma visão de futuro, controle, ou fiscalização, dos mais altos responsáveis camarários, que se isentam destas competências, servindo-se destes empresários para pôr em prática um projecto que ocultam aos Feirenses, que é afastar do centro histórico os moradores. Este é outro assunto, merece ser tratado à parte.
Voltemos à nova associação e à entrevista dada por um dos empresários/associados, o senhor Miguel Leão.
Uma associação empresarial, pois é do que estamos a falar, tem sempre como seu primeiro objectivo o estudo de estratégias com o fim de potencializar e defender os interesses das empresas associadas…
Quem não sabe disto… E daí não vem, nem viria mal ao mundo, bastava que o Miguel Leão não se escondesse, sem necessidade nenhuma, naquela “missão”, confiada por uma qualquer divindade, talvez Dioniso/Baco que será a de “fomentar o centro histórico”.
Como morador desse centro, tenho a dizer-vos que começam mal, pois a hipocrisia e cinismo nunca são a melhor forma de nos apresentarmos aos nossos concidadãos.
Todos somos conscientes das dificuldades que restaurantes e bares estão a viver. Talvez não seja pior lembrar estes empresários que não são excepção e que não pode ser a coberto das circunstâncias que vivemos que se justifica a ocupação de espaços públicos por empresas privadas, sem o digno observar do respeito pelos direitos dos moradores aí existentes. Assim foi a realidade no centro histórico feirense até ao confinamento.
Nas palavras de Miguel Leão, o tal eleito por uma divindade desconhecida, para revitalizar um espaço onde tem interesses empresariais, as prioridades da nova associação estranhamente são coincidentes com as mesmas que nos garantem, ou deveriam garantir os nossos impostos, e por isso a cargo da Câmara Municipal: trânsito, limpeza e policiamento. Que raio de confusão.
Trânsito, limpeza e policiamento, cada um destes temas, por si só, merecia uma reflexão mais exaustiva do que aquela que vos apresento, mas há um que é a plena demonstração do egocentrismo de quem se diz preocupado com o centro histórico da nossa cidade.
Todos sabemos que a grande maioria dos bares, assim como um número de restaurantes do centro histórico, se encontram localizados em zonas de trânsito proibido, no mínimo condicionado. No entanto, o Miguel Leão acha que isto não é suficiente, deseja condicionar ainda mais, onde precisamente é que não disse.
- Ó Miguel, será para fazer cumprir a regra de trânsito frente à Câmara Municipal Velha, ou para garantir, sem dúvidas, os lugares reservados às excepções feirenses. Imagino que vais protestar, porque o teu vizinho mais acima é um bocadinho mais “branco” que tu?
Limpeza no centro de uma cidade, que apresenta graves problemas, esse nem se encontra inscrito nas preocupações. Basta sair à rua e passar pelo centro e podemos observar que a limpeza das ruas e passeios tem merecido a preocupação do Poder.
Policiamento, já conhecemos a estória da história recente e sabemos o que aconteceu, quando isso ficou à responsabilidade dos bares. Recuso-me a comentar os comentários.
Pois então permitam-me apresentar-vos um desafio, um que vos obriga a uma maior seriedade na preocupação com o Centro Histórico de Santa Maria da Feira, que vos obriga a olhar em frente e para os lados, invés de ficarem de cabeça baixa a olharem o vosso umbigo guloso e egoísta.
COEXISTÊNCIA
Convinha que pacífica entre moradores e empresários da noite, na garantia de que os direitos de quem fez investimento para dar vida à noite feirense não colidam com quem ali reside.
É o difícil equilíbrio entre morador e a vida nocturna, mas não impossível, se cada um acreditar que há espaço e lugar para todos, desde que partamos da meta com respeito pelo próximo e muito em especial por aquele, que por razões sobejamente conhecidas, não tem voz. É desse silêncio criminoso que a Noite se aproveita para oportunamente se assenhorar daquele espaço, pondo e dispondo conforme o interesse deste ou daquele dono de bar, desrespeitando tudo, todos, destruindo a essência que humaniza o espaço, os moradores.
Eu sei, é uma tarefa difícil/hercúlea, ainda para mais quando na Câmara Municipal a pessoa com este pelouro não apresenta estofo, nem a imparcialidade necessária para mediar conflitos de interesses, opta pelo caminho mais fácil. É o nosso ‘Centeno’ local, um Must, mas à custa do sacrifício dos outros.
Era, portanto, mais satisfatório e uma mais-valia para a cidade que o aparecimento de uma associação privilegiasse a questão da humanização do espaço sem descurar o objectivo real de uma associação, que é pugnar pelos interesses dos seus associados.
Afinal, se não aprendemos nada, se a História e o passado recente não nos ensinaram nada, percebo porque é mais fácil partir estátuas.